Autora da história: Maria Nunes
Quem conta a história: Anónimo
Organização: ULHT
Título: Apenas uma Vida, Apenas Viva
Nível: Inicial
Língua: Português
Resumo: Esta é a história de uma imigrante brasileira que vive em Portugal e é seropositiva. Amanda conta o início de tudo, como ficou doente, como lutou por aceitar a sua doença, como partilhou a notícia, e a forma como depois vive a sua vida, partindo para um país estrangeiro, em busca de novas aventuras, mas também tentando vencer o medo.
Palavras-chave: VIH, sofrimento, discriminação, aceitação, luta
Amanda Flor tem 29 anos quando a falta de cuidado muda a sua vida por completo. Após muitos dias de cansaço e fraqueza, descobre que está infetada com o vírus do VIH. Diagnosticada em 2013, o VIH afeta-lhe a vida há oito longos anos. Hoje, já conformada com a sua condição, Amanda compreende a importância de falar sobre o assunto e quer desmontar os estigmas e preconceitos da sociedade.
Amanda Flor, nascida e criada em São Paulo, no Brasil, nunca soube o que queria ser. Ao longo da sua vida quer ser artista, médica e até jardineira, mas acaba por se licenciar em fisioterapia. É uma mulher que gosta de praia, livros de poesia, de viajar, conhecer culturas e sabe reconhecer o valor da amizade.
Aproxima-se o Carnaval de 2013 quando começa a sentir-se vulnerável. Os seus olhos, a sua garganta, o cansaço e as náuseas constantes levam-na ao médico. Num dia de calor intenso, a sua médica, Dr.ª Caroline, pede a Amanda para ir ao consultório. Há uma alteração nos seus exames. Lá vai Amanda, longe de imaginar o que a espera, a caminhar pela sombra. Incrédula com o resultado, repete o exame. Amanda tem 29 anos quando é diagnosticada com VIH.
Ao ser confrontada com o diagnóstico é invadida pelo arrependimento. Amanda é prisioneira das consequências do seu descuido num momento em que o prazer se sobrepõe ao racional.
Tem um grande dificuldade em partilhar a notícia com os seus pais, pois sabe como vão sofrer. Contudo, confessa que foi um privilégio receber uma reação tão gentil. Os pais de Amanda compreendem-na e apoiam-na. Mais difícil do que partilhar a dor com os seus pais é esconder a situação dos seus amigos, não porque os subestime, mas porque compreende os preconceitos que existem.
Às suas custas aprende que os estigmas e os preconceitos são mais mortais do que a própria doença. Por ser portadora de VIH é maltratada pela sociedade. Ouve muitos comentários que a marginalizam e acusam de ser uma prostituta. Amanda acredita que os preconceitos são facas que matam, ferem e desmotivam, e são fruto da desinformação das pessoas, principalmente por culpa das escolas, mas também por culpa da sociedade. Acredita que estamos aqui para despertar e dormir menos. Um animal não deixa de a abraçar por ser seropositiva. Os preconceitos são coisas que só os humanos são capazes de sentir.
Amanda vê-se obrigada a refazer os seus planos, não só para o Carnaval, mas também para a vida. Não viaja fisicamente nesse ano, mas faz uma grande viagem interior para se autoconhecer, compreender a doença que a vai acompanhar para o resto da vida e aprender a viver com ela. Todos os dias toma quatro comprimidos que lhe aumentam a carga imunitária e faz exames regularmente de quatro em quatro meses. Além do acompanhamento médico, também precisa de apoio psicológico.
Em setembro de 2018, muda-se para Portugal, pela facilidade linguística. A sua vontade de conhecer novas culturas leva-a a um país diferente, porém, que a faz sentir o mesmo que todos os outros: medo de se relacionar, medo de abraçar, medo de dar a mão… medo de morrer. É difícil assumir a responsabilidade e duplicar os cuidados que tem de ter, não só consigo própria, mas também com as pessoas à sua volta.
Em Portugal, Amanda arranja trabalho como auxiliar e terapeuta integrativa e continua a ter o acompanhamento médico necessário. Revela que é tão bom quanto o apoio que recebia no Brasil. A melancolia que sentiu e a vontade de fazer amigos em terras lusitanas levam-na a procurar apoio e descobre a Associação Abraço na internet, por pesquisa própria. O envolvimento com pessoas era um problema e deixou de o ser na associação, pois estão todos na mesma situação, a sentir exatamente as mesmas dores e tormentos que ela.
Quando questionada sobre se a sua vida é normal, Amanda hesita… “Não é uma vida normal, é apenas uma vida, apenas estou viva. Não é fácil enfrentar uma vida inteira de dor. Vivo com sombras. É chato tomar os comprimidos. Mas ainda bem que estou viva… e bem”.
Hoje, com 37 anos, Amanda ainda tem receio de falar sobre o assunto que é tão frágil e delicado, principalmente pela falta de informação que existe nesta sociedade que teima em não querer aprender. No entanto, e por esse motivo, compreende a importância de falar e dar uso à sua voz, principalmente para poder ajudar quem está agora a passar pela mesma situação. “Conversa com pessoas que amas. Aprende a ouvir o teu corpo. Aprende a ter paciência. Cuida-te e segue em frente”, aconselha.
Aceitar a doença é o mais próximo que temos da cura.